A terceira face da moeda é a verdade sinistra. Aquela que todos escondem, que todos temem por medo, vergonha...ou por simples coerência. Verdades protegidas da História, das Ciências, da filosofia. O que está além, das entrelinhas. A terceira face da moeda.

Coração Inquieto

"Eis o meu corpo, meu Templo Sagrado, casa de minh'alma onde mora o meu Amor."

Textos


Bisa Mélia
 
      Essa é uma história de família. Daquelas lembradas por uma prima ou tia de boa memória , que com certeza, toda família tem uma.
      Tia Lú é irmã de meu pai. Um pouquinho fora do peso, é bem verdade, mas é bonita e sorridente. É solteirona, mas é uma pessoa fantástica. Teve muitos namorados, mas nenhum quis casar, essa é uma das desilusões de tia Lú que, mesmo assim, não perde a esperança de, um dia, encontrar um grande amor, um bom marido para aquecer-lhe os pés, na velhice.
      O anel estava lá, perdido entre a caixinha de música e o estojo de maquiagem. Era um anel pequeno, feito para um dedo pequeno, um anel já bastante antigo e trabalhado com pequenas pedras brilhantes. Eu disse pedras brilhantes e não "pedras de brilhantes". Em outros tempos estaria junto ao anel a correntinha de pescoço, muito parecida com o velho anel, menos resistente, no entanto. Em outros tempos também estaria alí as luvas, os broches, os laços e fitas rosas e azuis, cores que a menina gostava. O sapatinho tipo princesa, as meias de organza e rendas.
      Eram tempos bons, o romance a jorrar por todos os lados: na música do piano,no farfalhar dos vestidos das mulheres, nos leques das ladies de meia idade, enfim...um blues na antiga vitrola...bons tempos.
      O anel pertencera a minha bisavó Amélia. Mulher pequena, mas de fibra. Sofrera os diabos nas mãos do meu bisavô, Josué, homem sisudo, bonito. " - Homem de muitas amantes.", contava tia Lú, " - aquele safado do seu bisavô levava as amantes pra dentro de casa e dona Melinha, coitada, tinha que cozinhar e por a mesa pras vadias.", tia Lú contava sussurrado, de um jeito que parecia fazer parte da história.
      Um dia, Bisa Mélia, cansada de tanta humilhação recorreu à Dom Bentinho, então, o irmão mais de velho do meu bisavô que, com muita presteza colocou-o para fora de casa, com as amantes e tudo e, o alertou que não se aproximasse de minha bisa e das crianças: Guidinha, a filha mais velha e o menino, o caçula, hoje, meu avô Tércio. 
      Depois de tudo isto bisa Mélia vendeu a casa, pegou o dinheiro e as crianças e foi para a cidade grande, onde passou a residir num casarão, próximo ao centro.
Sabiamente, Bisa Mélia colocou o menino Tércio num tradicional colégio de padres e, a menina Guidinha num tradicional colégio de freiras, como rezava os costumes da época.
      No Casarão minha Bisa "abrigava" as meninas menos favorecidas pela vida e, estas pagavam uma tacha, tipo pensão, para minha Bisa que, todas chamavam Dona Melinha.
      Assim, segundo tia Lú, Bisa Mélia criou os filhos e, eles nunca souberam de onde vinha o dinheiro.
      O caso veio à tona muito tempo depois que minha Bisa já falecera, pela boca de uma tal de "Luizinha", que foi uma das moças acolhidas no "Casarão da Dona Mélinha", como chamavam.
      Dona Luizinha, hoje é uma senhora, tinha apenas dezesseis anos e estava grávida quando foi morar no casarão. Enrabichada pelo filho de um Coronel da região, a pobre engravidara e, ficara legada á própria sorte. O filho de Luizinha não vingou, porém ela jamais deixou a casa de Bisa Mélia. Cuidava de tudo com amor e gratidão de filha. Saiu da casa da Bisa para casar-se com um jovem e promissor jorn
alista, indo morar em uma outra cidade.


Esse conto está no livro: Coração Inquieto - Contos, de minha autoria.
Regina Oliveira
Enviado por Regina Oliveira em 29/02/2012
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